Conhecimentos locais de pescadores

uma perspectiva intercultural para a educação em Ciências

Autores

  • Mariana Ribeiro Porto Araujo Oregon State University
  • Carmen Roselaine de Oliveira Farias Universidade Federal Rural de Pernambuco
  • Rita Paradeda Muhle Universidade Federal Rural de Pernambuco

DOI:

https://doi.org/10.14295/ambeduc.v26i1.13063

Palavras-chave:

Pescadores, ensino de ciências; diversidade cultural; saber local

Resumo

Os pescadores artesanais constituem grupos sociais que atribuem significado complexo ao meio marinho e seus fenômenos complementares, constituindo um repertório de conhecimentos válidos que não podem ser desconsiderados na escola. Essa é uma posição teórico-política que reconhece a complexidade dos sistemas sociais e do conhecimento constituído em comunidades que estabelecem seu modo de vida em contato direto com os sistemas ecológicos, como pescadores, marisqueiras, quebradeiras de coco babaçu, entre outras. Nesse estudo etnográfico buscamos compreender os saberes relacionados ao ambiente e à pesca em uma comunidade de pescadores artesanais do Manguezal do Pina/Recife e suas possíveis relações com os conhecimentos e habilidades em geral presentes na educação escolar em ciências. O trabalho de campo foi apoiado em procedimentos de observação participante e registros em diários e entrevistas ao longo de 18 (dezoito) meses. Os resultados apresentam um quadro rico de saberes associados ao cotidiano da pesca e ao ambiente estuarino. A partir deles, fazemos uma discussão sobre a importância dos saberes locais na necessária ressignificação do ensino de ciências, apostando em seu potencial de contribuir tanto com a visibilidade e o reconhecimento dos conhecimentos provenientes de contextos socioculturais diversos do escolar, como também, demarcar uma perspectiva por onde se possa vislumbrar criticamente o ensino de ciências atual e inaugurar novos patamares de ação para uma educação intercultural.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Mariana Ribeiro Porto Araujo, Oregon State University

Estudante de PhD em Antropologia na Oregon State University, graduada e mestre em Ciências Biológicas pela Universidade Federal Rural de Pernambuco com um ano cursado na Monash University/Melbourne-Austrália. Desenvolve trabalhos da área de Educação, Ictiologia, Direitos Humanos e Sociedade. Tem experiência na área de Educação Ambiental e Biologia de grandes peixes pelágicos, atuando nas áreas relacionadas às comunidades tradicionais marinhas, pesqueiras e questões sociocientíficas no ensino de Ciências. Igualmente, é participante de dois grupos de pesquisa vinculados ao CNPq com focos em multi e transdisciplinaridade na relação entre direito e sociedade, e ensino de Ciências.

Carmen Roselaine de Oliveira Farias, Universidade Federal Rural de Pernambuco

Graduada em Direito (FURG-1998) e especialista em Direito Ambiental (UNIMEP-2005). Mestra em Educação para a ciência (UNESP-2003) e doutora em Educação (UFSCar-2008) com estágio sanduíche em Lisboa (CIE-UL). Realizou entre 2009 e 2010 estágio de pós-doutorado no Programa de Pós Graduação em Educação da PUCRS no âmbito do PNPD/CAPES. Desde 2010 é professora do Departamento de Biologia da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Campus de Recife, lotada na Área de Ensino das Ciências Biológicas. É líder do Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação e Sustentabilidade (GEPES/UFRPE) e orienta trabalhos de IC, BEXT, mestrado e doutorado. Foi coordenadora do PPG em Ensino das Ciências da UFRPE de setembro de 2016 a janeiro de 2021. Atua em projetos de pesquisa e extensão nas áreas de educação ambiental e ensino de ciências, buscando articular perspectivas educativas e ecológicas em diferentes contextos. Linhas de investigação: educação ambiental e currículo; ensino de ciências e questões sociocientíficas e socioambientais; pesquisa de matriz fenomenológica; letramentos socioambientais.

Rita Paradeda Muhle, Universidade Federal Rural de Pernambuco

Doutora em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Escola de Humanidades da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Doutorado Sanduíche no Exterior na University of Saskatchewan (Canadá). Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Educação - PUCRS. Bolsista Integral CNPq. Bióloga graduada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Bacharel e Licenciatura), Especialista em Diversidade e Conservação da Fauna pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Educadora Ambiental em Projetos Socioambientais e formação de professores no Rio Grande do Sul. Faz parte do grupo de pesquisa "Cultura, Ambiente e Educação" - UFRGS, e do Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação e Sustentabilidade (GEPES). Atualmente é pós-doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Ensino das Ciências (PPGEC) da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Participação como pesquisadora colaboradora no Laboratório de Estudos Avançados Multidisciplinares da UERGS. 

Referências

ALMEIDA, Maria da Conceição de. Complexidade e cosmologias da tradição. Belém, UFRN EDITORA, 2001.

ALMEIDA, Rosiléia Oliveira de. “Ajofe e alcoometria: as escolas diante das mudanças socioculturais ligadas à produção de cachaça artesanal na microrregião de Abaíra, Bahia, Brasil.” Ciência & Educação, Bauru, v. 18, n. 1, p. 187-214, jan./abr. 2012.

ANDRÉ, Marli Eliza Dalmazo Afonso de. Etnografia da prática escolar. Campinas: Papirus, 1995.

BACHELARD, Gaston. A Dialética da duração. 2. ed. São Paulo: Ática, 1994.

BALICK, Michael J., and Paul Alan Cox. Plants, people, and culture: the science of ethnobotany. Scientific American Library, 1996.

BEZERRA, Onilda Gomes. “O Manguezal do Pina: a representação sócio-cultural de uma

“paisagem””. 2000. 337 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Universidade

Federal de Pernambuco, Recife, 2000.

BIZZO, Nelio. Ciências: fácil ou difícil? 2. ed. São Paulo: Ed. Ática, 2001

.

BORGES, Marcelo Gules; FARIA, Juliano Espezim Soares; BRICK, Elizandro Maurício. “Fenômenos como mediadores do processo educativo em ciências da natureza e matemática na educação do campo.” Revista Brasileira de Educação do Campo, Tocantinópolis, v. 2, n. 3, p.965-990, 2017.

BRAGA, Ricardo; SELVA, Vanice; COELHO, C. “Estratégias para conservação e gestão do

manguezal do Pina”. Relatório do Seminário e Oficina. 2008.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Reflexões sobre como fazer trabalho de campo. Sociedade e

Cultura, Goiás, v. 10, n. 1, p. 11- 27, jan./jun. 2007.

CALDEIRA, S. A.; PINHEIRO, Paulo César. Os saberes químicos presentes na produção

popular de doce de leite e a sua mediação para a sala de aula utilizando um sistema

hipermídia. In: Encontro Nacional de Ensino de Química, 15., 2010, Brasília, DF. Anais. Brasília, DF: Divisão de Ensino de Química da Sociedade Brasileira de Química, 2010. p. 2 - 5.

CAPRA, Fritjof. A Teia da vida: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos.

São Paulo: Cultrix, 1996.

CASTRO, Edna. “Território, biodiversidade e saberes de populações tradicionais”.Faces do trópico úmido: conceitos e novas questões sobre desenvolvimento e meio ambiente. Belém: CEJUP; UFPA-NAEA, 1997. p. 221-242.

COLL, César. Psicologia e currículo. São Paulo: Ática, 1996.

COUTO, Marcos Antônio Campos. “A geografia como ciência das práticas e dos saberes espaciais - por um novo modelo clássico de organização curricular”. Rev. Tamoios, São Gonçalo (RJ), ano 13, n. 2, págs. 5-25, jul-dez 2017

CREPALDE, Rodrigo dos Santos; KLEPKA, Verônica; PINTO, Tânia Halley Oliveira. “Interculturalidade e conhecimento tradicional sobre a Lua na formação de professores no/do campo”. Revista Brasileira de Educação do Campo, Tocantinópolis, v. 2, n. 3, p. 836-860, 2017.

DELIZOICOV, Demétrio; ANGOTTI, José André; PERNAMBUCO, Marta Maria. Ensino de ciências: fundamentos e métodos. São Paulo, Cortez, 2002.

DIEGUES, Antônio Carlos; ARRUDA, Rinaldo Sergio Vieira; SILVA, Viviane Capezzuto Ferreira da; FIGOLS, Francisca Aida Barboza; ANDRADE, Daniela. Saberes tradicionais e a biodiversidade no Brasil. São Paulo: USP, 2000.

EL-HANI, Charbel ; BANDEIRA, Fábio Pedro Souza de Ferreira. “Valuing Indigenous knowledge: To call it “science” will not help”. Cultural Studies of Science Education, 3, 2008, p. 751-779.

El-HANI, Charbeel, and Eduardo Fleury Mortimer. "Multicultural education, pragmatism, and the goals of science teaching." Cultural Studies of Science Education, 2.3 2007: 657-702.

GERBER, Rose Mary. Mulheres e o mar: uma etnografia sobre pescadoras embarcadas

na pesca artesanal no litoral de Santa Catarina, Brasil. 2013. 385. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC, Florianópolis, 2013.

GEERTZ, Clifford. Thick Description: Toward an Interpretive Theory of Culture. New York, 1973.

GOMES, Alexandro Souza; PINHEIRO, Paulo César. “O Resgate dos saberes envolvidos na engenharia popular de fabrico de tijolos”. In: Anais Congresso Brasileiro de Ensino de Engenharia, Ouro Preto: 2000. p. 25-39.

INGOLD, Timothy. Evolution and social life. Cambridge: Cambridge University Press, 1986.

INGOLD, Timothy.; KURTTILA, Terhi. “Perceiving the environment in Finnish Lapland”. Body and Society, v. 6 n. 3-4, p. 183-196, 2000.

INGOLD, Timothy. The Perception of the environment: essays on livelihood, dwelling and

skill. New York: Routledge, 2000.

INSTITUTO OCEANÁRIO DE PERNAMBUCO. Diagnóstico socioeconômico da pesca artesanal do litoral de Pernambuco. Recife: Instituto Oceanário de Pernambuco, v. 3, 2010.

JAPIASSU, Hilton. Um desafio à educação: repensar a pedagogia científica. São

Paulo, Letras e Letras, 1999.

LATOUR, Bruno. Jamais fomos modernos. Paris, Editora 34, 1994.

LEFF, Enrique. “Racionalidad ambiental y diálogo de saberes: sentidos y senderos de un futuro sustentable”. In: RAYNAULT, Claude et al. (Org.). Desenvolvimento e Meio Ambiente. Curitiba: Editora UFPR, 2003, p. 13-40.

LOPES, Alice Ribeiro Casimiro. Conhecimento escolar: ciência e cotidiano. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1999.

LOPES, Alice Ribeiro Casimiro. “Reflexões sobre currículo: as relações entre senso comum, saber popular e saber escolar”. Em Aberto, São Paulo, n. 58, p. 14-23, 1993.

MARQUES, Carla T. dos S.; GAMA, Erasto Viana Silva; CARVALHO, Aurélio José Antunes de. “A Agricultura do Povo Tupinambá de Serra do Padeiro, Buerarema - Bahia”. Revista Brasileira de Agroecologia, [S.l.], v. 4, n. 2, dez. 2009.

MALUF, Sônia Weidner. “A Escritura do texto: diálogos, riscos e afetações”. Jornadas Antropológicas, 2010.

MELLO, Flávia Cristina de; SOARES, Jules Batiata; KERBER, Lendro de Oliveira. “Astronomia e educação intercultural: experiências no ensino de astronomia e ciências em escolas indígenas.” In: SIMPÓSIO NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM ASTRONOMIA, 1., 2011, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro:, 2011. p. 1-11.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Résumés de cours: Collége de France 1952-1960. Paris,

Gallimard, 1968.

MOREIRA, Marco Antônio. Aprendizagem significativa. Brasília, Editora UnB, 1999.

MOREIRA, Ruy. O Discurso do avesso: para a crítica da geografia que se ensina. Rio de Janeiro: Ed. Dois Pontos, 1987b.

MORIN, Edgar; LE MOIGNE, Jean-Louis. A Inteligência da complexidade. 2. ed. São Paulo, Petrópolis, 2000.

PERRELLI, M. A. de S. Tornando-me professora de ciências com alunos indígenas Kaiowá e Guarani. 2007. 307 f. Tese (Doutorado em Ensino de Ciências e Matemática) - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Bauru.

PILETTI, Claudiano. Didática Especial. 15 ed. São Paulo, Ática, 2000.

POLANYI, Michael. The tacit dimension. London, Routdedge & Kegan Paul, 1966.

SOUSA SANTOS, Boaventura de. Um discurso sobre as ciências. Porto, Afrontamento, 2002.

SANTOS, Milton. Técnica espaço tempo: globalização e meio técnico científico informacional. São Paulo, Ed. HUCITEC, 1994.

SAUTCHUK, Carlos Emanuel. Aprendizagem como gênese: prática, skill e individuação.

Horizontes Antropológicos, Rio Grande do Sul, n. 44, p. 109-139, 2015.

SOUZA, Anna Carla Feitosa Ferreira; VIEIRA, Daniele Mariz; TEIXEIRA, Simone Ferreira. “Trabalhadores da maré: conhecimento tradicional dos pescadores de moluscos na área urbana do Recife-PE”. In: MOURÃO, José da Silva; SOUTO, Wedson de Medeiros Silva;

ALVES, Rômulo Romeu da Nóbrega (Org.). A etnozoologia no Brasil: importância, status atual e perspectivas. Recife: NUPEEA, 2010, p. 149-176.

VELHO, Otávio. "De Bateson a Ingold: passos na constituição de um paradigma ecológico". Mana. Estudos de Antropologia Social, p. 133-140, 2001.

Downloads

Publicado

2021-10-31

Como Citar

Araujo, M. R. P., Roselaine de Oliveira Farias, C., & Paradeda Muhle, R. (2021). Conhecimentos locais de pescadores: uma perspectiva intercultural para a educação em Ciências. Ambiente & Educação: Revista De Educação Ambiental, 26(1), 109–137. https://doi.org/10.14295/ambeduc.v26i1.13063

Edição

Seção

Dossiê "Educação Ambiental pós-colonial e comunidades tradicionais"