A linguagem da natureza e a fenomenologia de Goethe <BR> The language of nature and the phenomenology of Goethe

Authors

  • Jonas Bach Jr

DOI:

https://doi.org/10.14295/remea.v31i1.4269

Keywords:

fenomenologia da natureza, Goethe, linguagem

Abstract

Este artigo apresenta uma análise dos aspectos linguísticos da fenomenologia de Goethe. Como parâmetro metodológico da análise da linguagem, a fenomenologia de Flusser serve como embasamento teórico. Para Goethe, a natureza não é mero objeto, é atividade, torna-se o sujeito pesquisado. Seus procedimentos científicos buscavam uma linguagem humana que correspondesse à linguagem de manifestação da natureza. A ciência explora na linguagem o nível da conversação e Goethe explora, além disso, o seu nível poético num sentido lato. A dinâmica do organismo vivo exige a dinâmica flexível do sujeito pesquisador, que estrutura uma linguagem condizente com o fenômeno pesquisado, a natureza. A fenomenologia goetheana é a construção de uma linguagem científica que compreende a linguagem da natureza.

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Author Biography

Jonas Bach Jr

Pesquisador do Pós-Doutorado em Educação do Departamento de Filosofia da Educação da Unicamp, com bolsa PNPD/Capes. Doutorado e Mestrado em Educação (UFPR). Bacharel em Comunicação Social - Jornalismo (UFPR)

References

O Eu é, portanto, uma árvore cujas raízes, os sentidos, estão ancoradas no chão da realidade, cujo tronco, o intelecto, transporta a seiva colhida pelas raízes, transformada até a copa, o espírito, para produzir folhas, flores e frutos. (FLUSSER, 2005, p.46)

“Nesta transformação, neste salto abrupto e primordial, neste Ursprung, reside o milagre e o segredo do Eu. Há um abismo intransponível ao intelecto entre o dado bruto e a palavra” (FLUSSER, 2005, p.46).

Isto justamente caracteriza o intelecto: ele consiste de palavras, compreende palavras, modifica palavras, reorganiza palavras, e as transporta ao espírito, o qual, possivelmente, as ultrapassa. O intelecto é, portanto, produto e produtor da língua, “pensa”. (FLUSSER, 2005, p.47)

De acordo com Keim e Santos (2012, p.121), foi através da identificação entre construção da linguagem e construção da realidade que Flusser “abriu o caminho da investigação da realidade através da análise da linguagem, o que significa a transposição da problemática filosófica para o nível da responsabilização planetária e cósmica”.

[...] plana, desenvolve-se em duas dimensões, estende a língua, mas não a aprofunda. Não é criadora de novas palavras, de novos elementos da realidade, não é poética no sentido de poiesis, de estabelecer (Herstellen) realidade. A verdadeira filosofia ultrapassa a camada da conversação e participa da camada da poesia. Neste sentido abrange e supera a ciência. (FLUSSER, 2005, p. 139)

“Toda tentativa de analisar a língua neste estágio a afrouxa e lhe destrói a qualidade de impermeabilização, isto é, a qualidade poética” (FLUSSER, 2005, p.146).

“A concepção genética das partes da planta esbarra na fronteira da linguagem comum e convencional” (PÖRKSEN, 1986, p.87) .

Seu método é o da predicação definidora. As partes específicas são compreendidas primeiramente em sua solidariedade como partes idênticas ou semelhantes de um todo e só então em sua diferença recíproca. A utilização da linguagem é esclarecedora e não denominadora. (PÖRKSEN, 1986, p.87)

Jamais se reflete o bastante sobre o fato de que a linguagem é propriamente apenas simbólica, figurada, e de que jamais exprime diretamente os objetos, mas somente por reflexos. Tal é especialmente o caso quando se trata de seres que apenas se aproximam da experiência e que podem ser chamados antes atividades que objetos, estando no reino da doutrina da natureza em contínuo movimento. Não podem ser fixados, embora devam ser descritos; é por isso que se tentam todos os tipos de fórmulas, para se aproximar deles ao menos alegoricamente. (GOETHE, 1993, p. 134)

Nós executamos continuamente nosso conhecimento, ou seja, a associação entre percepção e conceito. Este desempenho primordial de nossa humanidade, a partir do qual o ser humano e o mundo surgem um do outro continuamente como um movimento ininterrupto um no outro, constitui o fundamento de nossa existência, o afluir incansável entre luz e escuridão. (WITZENMANN, 1987, p.35)

Lembrando mais uma vez Flusser (2005, p.46), as palavras (a seiva) são transportadas pelo tronco “ao espírito, o qual, possivelmente, as ultrapassa”.

A árvore do conhecimento é autotransformadora porque o pesquisador não está acabado, ele “deve elaborar um método adequado à intuição, evitando transformá-la em conceito e o conceito em palavras, agindo ou procedendo como se tais palavras fossem objetos”(GOETHE, 1993, p. 129).

Cuidado.

Matemáticos também traduzem o fenômeno em sua linguagem.

Vantagens e perigos

Exemplos para se desviar continuadamente. (GOETHE apud PÖRKSEN (2008, p.95))

A idéia de metamorfose é um presente do alto extremamente honroso, mas também extremamente perigoso, pois leva à ausência de forma, destrói o saber, o dissolve. É como a vis centrifuga e se perderia no infinito se não lhe fosse atribuído um contrapeso: quero dizer o instinto de especificação, a capacidade tenaz de persistir do que chegou uma vez à realidade; uma vis centripeta à qual nenhum elemento externo pode prejudicar o seu fundo mais profundo. (GOETHE, 1987, p.208)

“O nada, longe de ser um conceito vazio e negativo, torna-se um superconceito sinônimo do indizível” (FLUSSER, 2005, p.132).

Flusser (2005, p.133) orienta a interpretação de Wittgenstein: “a história do pensamento humano é a coleção das feridas que esse pensamento acumulou ao precipitar-se contra as fronteiras da língua”.

Objetivamente chama coisa em si, o de tudo diferente, o Não-eu. Subjetivamente se chama espírito, sujeito, Eu. São tentativas de dar nome ao inarticulável. Essas tentativas são responsáveis pelos chamados problemas eternos do pensamento: eternos por insolúveis. (FLUSSER, 2005, p.133)

“Ao realizar-se na língua, o intelecto perdeu essa irrealidade superior à realidade e procura reconquistá-la, superando a língua” (FLUSSER, 2005, p.133).

Referências

FLUSSER, Vilém. Da religiosidade: a literatura e o senso de realidade. São Paulo: Escrituras Editora, 2002.

_________. Língua e realidade. São Paulo, Annablume, 2005.

GOETHE, Johann Wolfgang von. Teoría de la naturaleza. Madri: Editorial Tecnos, 1987.

________. A metamorfose das plantas. Tradução, introdução, notas e apêndices de Maria Filomena Molder. Lisboa, Imprensa Naciona – Casa da Moeda, 1993.

________. Naturwissenschaftliche Schriften I. Band 13. Hamburger Ausgabe. München: Deutscher Taschenbuch Verlag, 2000. [Textos sobre ciência natural]

KEIM, Ernesto Jacob; SANTOS, Raul Fernando dos. Educação e sociedade pós-colonial: linguagem, ancestralidade e o bem viver – Paulo Freire e Vilém Flusser VÃNHVE – Xokleng/Laklãnõ e SUMAK KAWSAY – povos andinos. Jundiaí: Paco Editorial, 2012.

PÖRKSEN, Uwe. Deutsche Naturwissenschaftssprachen: historische und kritische Studien. Tübingen: Gunter Narr Verlag, 1986. [Linguagens alemãs da ciência natural: estudos históricos e críticos]

________. Goethes phänomenologische Naturwissenschaft. Sprache und Darstellung als Erkenntnisinstrument. IN: PLEŠTIL, Dušan; SCHAD, Wolfgang (Orgs.). Naturwissenschaft Heute im Ansatz Goethes: Ein Prager Symposion. Stuttgart: Verlag Johannes M. Mayer, 2008. p.89-103 [A ciência natural fenomenológica de Goethe: linguagem e representação como instrumento epistemológico]

SOKOLOWSKI, Robert. Introdução à fenomenologia. São Paulo: Edições Loyola, 2004.

WITZENMANN, Herbert. Goethes universalästhetischer Impuls: Die Vereinigung der platonischen und aristotelischen Geistesströmung. Dornach: Gideon Spicker Verlag, 1987. [O impulso universal-estético de Goethe: a associação da corrente espiritual platônica e aristotélica]

Published

2014-07-31

How to Cite

Bach Jr, J. (2014). A linguagem da natureza e a fenomenologia de Goethe <BR> The language of nature and the phenomenology of Goethe. REMEA - Revista Eletrônica Do Mestrado Em Educação Ambiental, 31(1), 76–93. https://doi.org/10.14295/remea.v31i1.4269

Issue

Section

Artigos